O último sábado (22) entrou para a história do Carnaval de Vitória. Motivo: a noite em que o sambista capixaba viu o maior desfile do Grupo Especial desde o retorno do Sambão do Povo. Ainda no lançamento dos enredos, em abril de 24, os temas antecipavam que estava por vir uma grandiosa festa. E assim foi feito. Apesar de dois desfiles em níveis abaixo das demais, 5 escolas apresentaram bom conjunto visual e musical.
JUCUTUQUARA
A primeira agremiação a entrar na avenida foi a Jucutuquara. Com o tema “Pulsar da vida”, de Orlando Junior, o desfile foi marcado por diversos problemas. A comissão de frente da coreógrafa de Giovana Gonzaga representava “As batidas do coração” e fez uma coreografia regular, sem grandes momentos. Apesar de não passar por complicações em dança, perderá ponto no quesito pelo tripé inacabado que estava com ferros totalmente aparentes. Mesmo com a forte chuva o casal de mestre-sala e porta-bandeira Marina Zanchetta e Marcos Paulo sustentou o pavilhão da coruja e fez três apresentações frente as cabines que podem trazer boas notas preciosas para a escola na próxima quarta. Apenas na primeira cabine julgadora viu-se um problema no costeiro da porta-bandeira que caiu no início do bailado.

As alegorias possuíam inúmeros problemas de acabamento, incluindo ferros aparentes. Outros quesitos que a escola foi irregular foram: evolução – escola precisou correr e abriu diversos buracos em frente às cabines; bateria – atravessou durante em algumas bossas; harmonia – escola cantou pouco e o intérprete estava rouco. Além dos problemas citados, a Jucutuquara também ultrapassou o tempo máximo permitido de desfile e perderá décimos nesta obrigatoriedade.

CHEGOU O QUE FALTAVA
Em poucas palavras: o maior desfile da história cinquentenária da tricolor de Goiabeiras. O que se viu desde o primeiro minuto que a Chegou entrou na avenida foi um padrão estético de muito bom gosto apresentado por Vanderson Cesar, carnavalesco. Cantando Goiabeiras, as particularidades culturais do bairro e como tudo ali gira a partir do manguezal, o desfile iniciou evocando Nanã e a ancestralidade do mangue. O coreógrafo Rodrigo Carvalho, que voltou para o carnaval neste ano, mostrou que está cada vez mais atual, numa comissão que teve um tripé bastante funcional que elevou o patamar dos bailarinos, quase igualando a altura da cabine de jurados. 26 componentes se revezaram para apresentar o tema. Com passos firmes, caras e bocas que intensificaram ainda mais a dramaticidade do momento, o ápice foi quando a panela de barro junto de uma paneleira aparecia e era acolhida pela Orixá.

O casal de mestre-sala e porta-bandeira da agremiação, Kleyson e Amanda, fez três apresentações de cabine perto da perfeição. Com exceção da segunda, que a Amanda teve problema de equilíbrio e acabou indo ao chão, as demais mostraram porque a dupla é um dos casais mais regulares do Espírito Santo.
A bateria Ritmo Nervoso, composta por diversos ritmistas formados em oficina, foi muito bem na proposição de bossas e – o principal – na execução. Convenções focadas nos atabaques foram efetuadas com muita segurança. A sensação que fica é que a maturidade chegou para “Ritmo Nervoso” e que competência para buscar nota máxima a bateria tem. O samba-enredo, entoado pelo excelente cantor Igor Viana cresceu ainda mais e deve garantir notas excelentes.

Nos quesitos que cabem ao carnavalesco (enredo, fantasias, alegorias) muito provavelmente a escola vai gabaritar. Apesar de denso, o tema foi contado pensando na festa popular que é o carnaval. E com o dever de exaltar também o cinquentenário da escola. Ou seja, feito pela Chegou e para o território onde ela reside. Pós-desfile, todo público ficou sabendo que Goiabeiras é muito mais do que um lugar.

PIEDADE
A Mais Querida escolheu um tema alegre para desfilar no ano em que completa 70 anos. Com Ibejis, desenvolvido por Vitor Vasale, a Piedade pode se orgulhar do que foi apresentado, mas ainda é cedo para afirmar que a agremiação está pronta para voltar a ser campeã do Carnaval Capixaba.
Os coreógrafos George Falcão e Ricardo Reis trouxeram a comissão de frente que representava “Do nascimento a festa de Ibeji, a alegria será em dobro”. Contando o itan de Xangô e Oya, que engravida dos gêmeos, os deixa no rio e eles são adotados por Oxum. Toda esta representação aconteceu em cima de um gigantesco tripé, muito funcional. Detalhe importante, no topo do elemento cenográfico, a apresentação acontecia para os jurados, mas, simultaneamente na parte de trás, o público também era presenteado com apresentações. Mostrando respeito dos coreógrafos para os avaliadores do carnaval, mas também para todos aqueles que estão presentes na festa.

O casal Vinicius e Julia mostrou – mais uma vez – porque é uma das melhores duplas da atualidade. Um bailado leve, com rodopios sutis, abertura correta de bandeira e, principalmente, inserções pontuais de passos que se encaixam no samba-enredo. Um exemplo, é quando o mestre-sala fingiu que estava soltando pipa sem parar de bailar. Com muita segurança, irão trazer notas excelentes na quarta-feira.
Nos quesitos plásticos, o artista Vitor Vasale nunca escondeu que tentaria formas diferentes de uma concepção de carnaval a partir do que ele entende como arte. E assim o fez. As alegorias possuíam formato diferente, desde o abre-alas, até a última que era em formato circular. Ideia e concepção foram boas, mas só saberemos como será a avaliação do corpo julgador na próxima quarta-feira. Em sua primeira oportunidade na Piedade, o carnavalesco mostrou que está mais do que pronto para conduzir um desfile.

O questionado samba-enredo da escola foi um dos que mais funcionou durante a noite. Isso pode ser atribuído também ao excelente desempenho musical de Kleber Simpatia, Luiz Felipe e todo carro de som. Pegaram a responsabilidade para eles e a receptividade da comunidade forte e aguerrida resultou numa harmonia coesa. Outro ponto positivo da parte musical foi o desempenho da bateria Ritmo Forte. Segunda bateria mais regular atualmente no Grupo Especial do Carnaval Capixaba, os ritmistas e mestre Tereu devem levar para casa boas notas na quarta, após abertura dos envelopes.

Alguns quesitos podem afastar a Piedade do título. Em fantasia, algumas alas foram apresentadas de maneira simples e fora de um padrão de leitura apresentado em outras. Deu a sensação de que “faltou dinheiro”. Em evolução, a escola abriu inúmeros buracos em frente às cabines julgadoras e deve receber notas baixas. O samba, apesar de ter sido cantado, carece de letra.
MOCIDADE UNIDA DA GLÓRIA
A atual campeã do Carnaval Capixaba entrou na avenida decidida a “vender caro” a oportunidade do tricampeonato. Com enredo “O guerreiro da capa encarnada Jorge do povo brasileiro”, desenvolvido pelo multicampeão Petterson Alves, a MUG veio imponente desde sua abertura. Apesar da comissão optar por vir no chão – sem tripé – mais uma vez, a leitura a partir da dança foi bem fácil. Marcelo Lages trouxe os “Arautos de Aruanda” com passos e alinhamentos corretos. Ponto interessante é a divisão entre catolicismo e sincretismo de São Jorge com Ogum. Já no primeiro quesito o espectador consegue entender a proposta do desfile como um todo.

Hudson Maia e Leticia Malaquias, responsáveis por carregar o primeiro pavilhão muguiano, fizeram três apresentações perfeitas e que podem garantir a nota máxima nas três cabines. O bailado dos dois foi correto e aguerrido, com passos pontuais que faziam menções a letra do excelente samba-enredo.
A bateria Pura Ousadia entrou na passarela com um desafio bem particular. Se gabaritar, serão seis carnavais sem perder um décimo sequer. E se depender dos mestres João e Lucas, e os ritmistas da vermelho e branco, a história será escrita mais uma vez. Não há nada negativo para falar das apresentações nas cabines e a nota trinta está bem perto de chegar. Se vier, será a única bateria nota 180 do Carnaval Capixaba. Teve adarrum no refrão, tamborim cada vez mais ousado e bossas específicas em cima dos instrumentos. Um recital para os apreciadores de percussão.

Na estreia da dupla de intérpretes composta por Ricardinho da MUG e Thiago Brito, os quesitos musicais também devem gabaritar. Com um dos melhores sambas do ano nas mãos, coube aos cantores aproveitar cada nuance, cada verso e cada possibilidade de criação o melhor possível. A resposta do desfilante foi positiva e o quesito harmonia levará nota 30.
Um único porém no desfile que pode fazer a MUG receber notas menores que 10, mas que não a tira do páreo pelo título, é a falha de acabamento num dos tripés. A saia não seguia um padrão estabelecido pela MUG no próprio desfile e ficou aquém dos demais carros. O tripé em questão estava no terceiro setor e se chamava “Jorge da Malandragem: O Guardião da Boemia”.

NOVO IMPÉRIO
A última escola campeã fora do eixo Vila Velha x Cariacica entrou na avenida disposta a mudar a estética de seus carnavais recentes. Com enredo apostando na boemia noturna capixaba, nas décadas de 30, 40 e 50, desenvolvido pelo carnavalesco Osvaldo Garcia, a azul, branco e rosa do Caratoíra fez um desfile que pode elevar o ego imperiano, desde que a escola esteja ciente dos erros que cometeu. Para que no futuro, não os cometa novamente.

Chamada de “A boemia capixaba: o Espírito Santo do Malandro nas noites de Vitória”, a comissão de frente do coreógrafo Matheus Schiffmann já entrou na avenida perdendo pontos sem sequer ser avaliada pelos jurados. O tripé que fazia parte do conjunto não foi concluído e ficou de fora do desfile. Além deste problema, faltou desenvolvimento na apresentação e careceu de movimentos com possibilidade de atrair uma nota alta. Deu a sensação de que o que fazia a comissão “acontecer” e propor algo de diferente era justamente o tripé.
A dupla Emanuel Lima e Gessya Santana, casal de mestre-sala da escola, fez apresentações bem seguras e podem ser um dos quesitos da escola a garantir, ao menos, nota 20. Enquanto a porta-bandeira tem um bailado bonito e imponente, empunhando o mastro do pavilhão com muita firmeza, o mestre-sala soube recepcionar com bastante intimidade todas as vezes que a bandeira lhe foi proposta. Apesar de serem estreantes – como dupla e na escola – o grau de intimidade no bailado faz acreditar que estão juntos há muitos carnavais.

No quesito alegorias e adereços a Novo Império propôs uma nova roupagem para si mesma. Osvaldo, carnavalesco, cresceu consideravelmente o tamanho dos carros e fez com que a escola tivesse uma abertura bastante imponente. Apesar de grandes, os carros possuíam problemas visíveis de acabamento que podem render décimos preciosos.
Com um dos sambas que menos se comentava durante o período pré-carnavalesco capixaba, a qualidade musical foi elevada com a voz de Danilo Cezar e carro de som. Também conhecido por melhorar sambas harmonicamente, o intérprete oficial da escola mais uma vez mostrou porque é um dos grandes cantores do Espírito Santo. Uma condução perfeita, mas que não recebia de volta do componente. O canto da escola foi fraco, tendo destaque apenas no refrão principal. O quesito que pode tirar nota 30 é bateria. Em seu retorno, mestre Vinicius Seabra parece ter conseguido ajustar alguns problemas crônicos da Orquestra Capixaba de Percussão. Seabra trouxe a bateria um pouco mais para trás e igualou as batidas de caixa. A bossa do partido alto foi bem executada, garantindo aplausos dos presentes.
Na passagem pela última cabine, a Novo Império passou por problemas no quesito evolução e deverá perder décimos também. O quesito enredo será o mais prejudicado dos 9. Já que a escola desfilou sem dois tripés. Dificultando assim a leitura e a transição de um subtema para outro.
BOA VISTA
Com vontade de recuperar o título que não vai para Cariacica desde 2020, a Boa Vista entrou na avenida desenvolvendo o enredo em homenagem ao renomado fotógrafo brasileiro – que viveu em terras capixabas na juventude – Sebastião Salgado. A comissão de frente de Patrick Alochio representou a “Janela da alma” e fez uma apresentação bastante emocionante. Conhecemos o homenageado em três momentos. Ele jovem, quando se apaixona por fotografia e por sua companheira Lélia; ele consagrado, com a câmera nos ombros, retratando “os olhos do mundo”, e ele sendo homenageado, onde uma bandeira da Boa Vista é desfraldada. A coreografia aconteceu no chão e em um tripé com dois cenários que funcionaram perfeitamente. Vale frisar que a máscara usada pela bailarina que representou Sebastião Salgado foi muito bem feita e convenceu bastante.

O experiente casal de mestre-sala e porta-bandeira, Bruno Simpatia e Vanessa Benitez, fez uma apresentação de gala nas três cabines. Bruno possui um dos sapateados mais elegantes do carnaval capixaba e mais uma vez mostrou isso no pé. O cortejo feito por ele e o bailado de Vanessa empunhando o pavilhão com segurança devem garantir novamente a nota máxima no quesito.
Cahê Rodrigues, carnavalesco que estreou em carreira solo na Boa Vista neste ano, sabe das dificuldades para conquistar um campeonato. E sabe também que propostas ousadas podem atrair os olhares ainda mais positivos para a escola. No abre-alas, Cahê apostou em um preto e branco – principal característica das fotos feitas pelo homenageado – e em azuis, presentes na águia altaneira no primeiro chassi, e em olhos espalhados por toda extensão da alegoria. Foi um conjunto alegórico coeso, belo e bem acabado.

O padrão “Boa Vista de qualidade” em harmonia e evolução aconteceu novamente. A escola mais correta do carnaval nestes dois quesitos andou da forma que precisa andar, sem interromper o desenvolvimento do desfile como um todo e cantou como sempre. Não é costume da tricolor berrar o samba, e nem é necessário isso. Mas os componentes cantam da concentração à dispersão e a nota com certeza vai vir. Se com sambas medianos a Águia Furiosa mostrava competência, neste ano, a poesia rica em letra e melodia em homenagem a Sebastião Salgado foi um presente para mestre Gustavo. Bossas pontuais, que casavam exatamente com o que estava sendo cantado, deixando o intérprete Emerson Xumbrega ainda mais solto no desfile e com disposição para cantar o excelente samba.

IMPERATRIZ DO FORTE
A verde e rosa do Forte São João, que retornou ao Grupo Especial em 2024, teve a dura missão de encerrar os desfiles do Carnaval Capixaba 2025. No enredo sobre Angola, o excelente samba caiu como luva nas mãos do intérprete Dodô Ananias e o carro de som da Imperatriz. Sendo estes um dos destaques. Junto também da bateria Berço do Samba. Outros pontos positivos no decorrer do desfile foram os dois primeiros quesitos. A comissão de frente dos coreógrafos Ewander Rocha e Patrick Cadette veio no chão, sem a utilização de tripé e com 14 componentes, mesclados entre animais e a realeza africana. Os passos tiveram sincronia e receberam uma resposta positiva do público que ainda estava no Sambão do Povo.

O casal de mestre-sala e porta-bandeira foi formado por Thiaguinho Mendonça e Amanda Poblete. A dupla estreante na escola fez boas apresentações com passos e bailados característicos do Rio de Janeiro. Com um “empunhar” de bandeira mais valente e riscado mais leve, dando a impressão de que estão mais soltos, devem levar nota máxima no quesito para a verde e rosa.
As preocupações para o torcedor da Imperatriz começaram a aparecer em um quesito visual. As alegorias tinham problemas de acabamento e não tinham tanta criatividade. Em contrapartida, o conjunto de fantasias foi bem elaborado, deixando o chão da escola bem vestido.

QUEM LEVA?
A apuração desta quarta-feira promete fortes emoções. Três escolas estão na busca pelo título da elite do Carnaval Capixaba 2025. Por ordem de desfile: Chegou O Que Faltava, Mocidade Unida da Glória e Independente de Boa Vista. Ao contrário do que foi visto na leitura de notas de 2024, quando a MUG abriu quatro décimos de vantagem, neste ano a perspectiva é diferente. Nota a nota as comunidades de Goiabeiras, Glória e Itaquari vão comemorar por estarem mais perto do título. Se for pra Chegou, é um marco na história da tricolor por ser o primeiro campeonato, justamente no ano em que completa 50 anos. Se for para MUG, sela o tricampeonato inédito para vermelho e branco. Se for para Cariacica, é o retorno de uma gigante do Carnaval Capixaba que não vence desde 2020.
No meio da tabela, Piedade e Novo Império vão disputar décimos para ocupar a quarta e quinta colocação. A menos que alguma reviravolta aconteça devido às obrigatoriedades de desfile, essas são as pretensões de ambas as escolas após desfiles apresentados.
Na luta contra o rebaixamento e consequentemente ida para o Grupo de Acesso A, estão Jucutuquara e Imperatriz do Forte. As duas tiveram problemas e levarão notas baixas dos jurados em diversos quesitos. Será com emoção do início ao fim.